sábado, 22 de agosto de 2015




AS ESCOLAS PRIMÁRIAS DO NOSSO CONCELHO

 Monumentos da nossa memória 


Nostalgia.
O edifício da escola primária foi o nosso primeiro local de trabalho. Ali se cumpria o primeiro horário. Ali se conheciam os primeiros colegas do ofício. Ali se criaram amizades, mais ou menos duradouras. Quatro anos de calendário (entre os 7 e 11 de idade) era o tempo normal para se obter o exame da 4ª classe. Durante este tempo ali usufruímos do trabalho e dedicação dos nossos professores, salpicado aqui ou ali de atitude mais ríspida. Recordamos a sala de aula: o quadro preto na parede, a mesa do professor, o ponteiro, as carteiras dos alunos, os tinteiros, os mapas na parede. E também a menina-de-cinco-olhos, a amiguinha que, ora justa ora injustamente, frequentava uns mais que outros, mas que regra geral a todos visitava. Recordamos a saca de pano, onde fomos carregando a ardósia, o lápis de pedra, o caderno, a tabuada, os livrinhos de leitura das 1ª, 2ª, 3ª e 4ª classe, da aritmética, geometria, geografia, história, gramática. Livrinhos que se foram extraviando, mas cujas reimpressões ora nos permitem recuperar e guardar. Está tudo em memória.    
E claro que hoje (2015) existem outros manuais, outras filosofias, outros autores. Mas não é a mesma coisa. É que não foram estes, mas aqueles autores e professores de meados do século passado (anos cinquenta) que nos botaram ao mundo das letras e das ciências. Que nos deram asas para tomar novos rumos! Obrigados mestres! Bem-haja! 

Histórico.
Vindas da Monarquia, da 1ª República ou do «Plano dos Centenários», (Estado Novo), nas freguesias de Castanheira de Pera e Coentral funcionaram plenamente escolas primárias em:    
·       Coentral
·       Pera
·       Bolo
·       Castanheira
·       Gestosa
·       Troviscal
·       Moita
·       Sarzedas

Lugares com um ou dois edifícios. Escolas com uma ou mais salas de aula. Seria interessante existir um livrinho com a história de cada uma destas Escolas. Sua tipologia. Ano de construção. Ano de instalação. Custo da obra. Forma de pagamento. Legados. Outros elementos do processo. Fotos várias. Professores que, no todo ou em parte, nela leccionaram. Alunos que, no todo ou em parte, a frequentaram. Eventos que nela ocorreram. (A título de exemplo recordamos em 1955 uma gravação (canto) dos alunos do Prof. António Maria Saraiva, para uma programa da Emissora Nacional). Alguns destes elementos ainda existem na memória das gentes, mas carecem de ser despertados, conversados para se transmitirem. Muitos outros existirão porventura em escritos dispersos no espaço e no tempo. Mas sem a junção, a presença e a consulta que o livro sempre proporciona. E seria interessante porque estes edifícios constituem para muitos dos seus antigos alunos pequenos monumentos, quantas vezes dizendo-lhes mais do que alguns outros maiores que se visitam pelo país.   

Centenários.
O denominado «Plano dos Centenários» foi um programa de construção de Escolas Primárias, projectado, aprovado e executado pelo Estado Novo (l940-1960). «Centenários» porque em 1940 se celebrou o «3º centenário» da restauração da independência (1640-1940) e em 1943 se viveu o «8º centenário» da fundação na nacionalidade (1143-1943). Para saber mais insira «plano dos centenários» na janela «Google» e confira textos e imagens. 

Encerramento.
É do domínio público que todas as escolas primárias do nosso concelho foram sendo sucessivamente encerradas durante os últimos dez anos. E que os respectivos alunos foram transferidos para o Agrupamento de Escolas Dr. Bissaya Barreto, a funcionar, condignamente, na imediação da vila.   
Foi, afinal, o que sucedeu por toda parte. Aldeias desertificadas. Diminuição da natalidade. Novo reordenamento da rede escolar. Resultado: quatro ou cinco mil escolas primárias encerradas por todo o país, (continente e regiões autónomas). 
E que destino se tem dado a estas escolas assim encerradas? Certamente os mais diversos, consoante as circunstâncias locais. Mas, as noticias publicadas fazem-nos saber que geralmente se têm mantido na área das humanidades. Convertidas em bibliotecas, museus, livrarias. Escolas de música, canto, cante e dança. Associações culturais, desportivas e recreativas. Actividades seniores. Gabinetes de estudo, exposições, conferências. E nos casos em que têm transitado para a habitação social, restauração, turismo, o protocolo vincula a manter a sua «traça», a conservar a sua «alma»: aqui existiu uma escola!
Existem hoje aldeias serranas em que, tendo fechado todo o comércio local, o edifício da antiga escola primária constitui o único lugar de conchego e convívio de inverno. E de verão o procurado ponto de encontro de diálogo e alegre convívio entre gerações. Sublime!
                                                                                                                  
                                                                                                                    Francisco H. Neves
Texto publicado inicialmente no jornal O RIBEIRA DE PERA in :
http://www.oribeiradepera.com/francisco-h-neves-cronica-da-fraga-as-escolas-primarias-do-nosso-concelho-monumentos-da-nossa-memoria/#.VdiJeP3luvE