quarta-feira, 19 de abril de 2017

Foto de Jorge Nunes

Diocese - Paróquia – Pároco – Fiéis -
Conselho Económico – Comissão de Festas – Grupo coral.
Servir na Igreja é uma honra mas não é um direito
O princípio da confiança pastoral




Dissenso. No âmbito da nossa Paróquia de São Domingos (Castanheira de Pera) suscitou-se um dissenso interno envolvendo a pirâmide: «Pároco – Conselho Económico – Comissão de Festas - Grupo Coral». Altercação continuada. Subida do caso à Diocese. Confirmação da decisão do Pároco. Burburinho na comunicação social. Caso impróprio em tempo quaresmal de paz e reconciliação. E no interior de um templo sagrado, lugar de baptismo e matrimónio de muitos dos nossos antepassados. Lugar de última passagem de muitos dos nossos mortos, que chorámos. Lugar de respeito e veneração. Vamos dar uma volta jurídica pelo caso.  


Ajudantes. É conhecida a hierarquia da Igreja Católica, (Papa, Cardeal, Arcebispo, Bispo, Padre, Diácono, Leigo). Numa comunidade pequena como a nossa, onde não existe outro pároco, nem diácono (seminarista), todo o serviço da paróquia (litúrgico e de gestão) tem de ser assegurado pelo Pároco (pastor e governador), com a ajuda dos fiéis leigos. É o que preceitua o Art.º 519º do Código de Direito Canónico (CDC).
Com a ajuda dos fiéis leigos… Eis uma ideia que devemos reter e consciencializar. Realmente, em todas as paróquias, o papel dos fiéis leigos é o de ajudantes, auxiliares,  cooperantes, (Art.º 208º, Art.º 228º § 2, Art.º 519º, Art.º 537º, Art.º 759º, Art.º 766º Art.º 776º CDC). Mesmo os cientistas e os fiéis que desfrutam de proeminência, quando solicitados ou por dever, dão a sua opinião ou parecer, mas sempre «salva a reverência devida aos Pastores» (Art.º 212º § 3 CDC).


Convidados. Numa paróquia pequena como a nossa os fiéis leigos podem ser chamados a desempenhar ou suprir os ofícios de acólito, leitor, comentador, cantor e outros (ministérios laicais), sempre segundo as prescrições do direito, (Art.º 230º §§ 1,2,3 e Art.º 766º CDC), isto é, conforme as normas do Código de Direito Canónico (CDC) e diplomas complementares diocesanos. O acesso a estes serviços faz-se por convite (Art.º 206º § 2), deputação ocasional (Art.º 230º § 2) ou escolha (Art.º 785º CDC). 
Em suma, todos os chamados têm o estatuto de convidados do Pároco. 
E compreende-se. O Padre é o presidente da Eucaristia e das demais celebrações litúrgicas. É legítimo que se pretenda fazer auxiliar de pessoas idóneas, da sua inteira confiança. Executar uma liturgia harmoniosa, coesa, bem sintonizada.
Quando um Pároco cessa funções numa paróquia, com ele cessam funções todos os seus convidados. Incluindo os membros do Conselho  Económico, (Art.º 15º nº 2 CE). Fiéis estes que depois podem vir a ser reconduzidos ou não pelo novo Pároco.  


Princípio da confiança pastoral. Com sublinhado nosso, preceitua o Art.º 228º § 1 CDC:
«Os leigos que forem julgados idóneos, têm capacidade para que os sagrados Pastores lhes confiem os ofícios eclesiásticos e outros cargos que podem desempenhar segundo as prescrições do direito».

Esta norma consagra um importante princípio orgânico na vida das nossas Paróquias: o princípio da confiança pastoral. Quer dizer, o Pároco, no seu elevado critério, convida livremente os fiéis leigos que bem entender. Todavia, se deles vier depois a perder a confiança pastoral, pode livremente e a todo o tempo deles prescindir ou remover (sentido da norma a contrario). É claro que o Pároco deve agir aqui com ponderação e bom senso. Mas também com firmeza se necessário! A propósito recordemos que há perto de 40 anos, o então Padre Dr. António José de Matos, num gesto firme, transferiu o grupo coral do Altar-mor para o Coro-alto da Igreja. Ainda a propósito dir-se-á que o actual Pároco sendo algo idoso e doutorado em engenharia, a sua formação académico-eclesiástica é recente. É um Homem culto e actualizado. 


Honra, não direito. Num breve apontamento publicado no sítio Aleteia, o liturgista, depois de se referir à tripla formação do leitor (bíblico-litúrgica, técnica e espiritual) conclui: «Realizar este ministério é certamente uma honra… Não é um direito, mas um serviço em prol da assembleia litúrgica».
 http://pt.aleteia.org/2015/03/05/3-regras-fundamentais-para-os-leitores-da-missa/ 
E realmente assim é. Doutrina válida para todos os demais fiéis leigos que ajudam, (acólitos, leitores, cantores, ministros laicais). Todos prestam um serviço honroso, mas daí não lhes advém direito adquirido algum. Não há aqui lugares cativos. Por isso, com o devido respeito, dir-se-á não fazer sentido pretender-se, pela via da coação psicológica, que alguém se mantenha convidado exatamente de quem o desconvidou! Como também não são felizes, no âmbito do Templo, atitudes de lacinho branco que, no foro canónico podem constituir desobediência coletiva (Art.º 212º § 1 CDC) e, no foro comum, perturbação a acto de culto (Art.º 252º CP).

Conselho. O Conselho Económico Pastoral resulta de um imperativo canónico, (Art.º 537º CDC). Rege-se por estatutos próprios, no caso por Decreto 20/12/1990 da Diocese de Coimbra. (Google: diocese de Coimbra estatutos do conselho económico paroquial). É composto pelo Pároco (que preside), secretário, tesoureiro e vogais. Homologação na diocese. Período triénio. Exerce a administração e gestão do Fundo Paroquial. Inventário dos bens móveis e imóveis. Receitas e despesas. Aquisição de bens e serviços. Documentação. Prestação de contas anual. 


Raiz do dissenso. Face ao que está publicado, a raiz do caso remonta a 2013 e 2014, anos em que (Agosto) uma Comissão (jovem) realizou a Festa de São Domingos (Igreja Paroquial). O que então se terá passado foi que esta Comissão de Festas (CF) não apresentou ao Conselho Económico (CE) o relatório de contas e o respectivo saldo, como determina o Art.º 29º, alínea h) dos Estatutos CE. O que, por sua vez, impediu o Conselho, nesta parte, de prestar contas à Diocese até Fevereiro, do ano seguinte, como determina o Art.º 16º, alínea i), do mesmo diploma. Esta conduta da Comissão (“retenção na fonte”) é susceptível de criar alguma crispação (continuada). A comunidade até pode achar bem a intenção da Comissão de adquirir um órgão novo para a Igreja. Como se adquiriu. Só que tal aquisição deveria processar-se (receita e despesa) através das vias estatutárias competentes e não à sua revelia. E atempadamente. E nisso toda a Comissão (CF) é responsável. Porque, para este efeito, todos os seus membros são tesoureiros, visto que a sua responsabilidade é aqui individual e solidária, (Art.ºs 199º, 200º 1, 512º 1 e 518º Código Civil). Mas afinal o que é que a CF tem a ver com o Grupo Coral? Em princípio nada. Devia ser alheia. Só que alguns elementos da CF fazem também parte do Grupo Coral. E, por essa via, o caso transitou para o Grupo Coral, onde se instalou. 


Diocese. Gorada a conciliação local, o caso subiu a Coimbra. Instrução. Ponderação. Decisão. E para a anunciar, a Diocese honrou a nossa Paróquia com a presença do seu Vigário-Geral, Padre Dr. Pedro Miranda que aqui veio celebrar a Eucaristia. Antes porém, leu publicamente o comunicado com os fundamentos da decisão. Decidiu-se, está decidido. Por quem tem competência e jurisdição. Ponto final.   




                                                                                                                                              FRANCISCO H NEVES

                                                                                            

 Texto nosso publicado no jornal O RIBEIRA DE PERA edição impressa de 16/4 



Aditamento:

Numa reportagem local a RTP registou, além do mais, a leitura do comunicado Diocesano:  https://www.youtube.com/watch?v=1QedJp400Zo 


Num programa da SIC, elementos do grupo coral expuseram a sua motivação.
Um Padre independente, da Diocese de Lisboa, fez o comentário.